A câmara escura e o surgimento do daguerreótipo

A história da fotografia está intimamente ligada ao conceito da câmara escura. A câmara escura é um ambiente (que pode ser tanto uma sala quanto uma caixa) isento de luz em seu interior, exceto por um orifício muito pequeno no centro de um de seus lados. A luz, ao ultrapassar este orifício, forma uma imagem invertida e pouco nítida na parede oposta dentro da câmara escura.  


Figura 1: Representação do funcionamento de uma câmara escura

A câmara escura é usada na fotografia tanto analógica quanto digital. A imagem é formada no interior da mesma, quando a luz que atravessa o orifício atinge o material fotossensível. O tempo de exposição e a nitidez da imagem dependem do tamanho do orifício: se este é grande, a imagem fica menos nítida, e o tempo de exposição é menor. Da mesma forma, quanto menor o orifício, mais nítida é a imagem, e maior o tempo de exposição. A primeira descrição de uma câmara escura vem do século IV a.C, pelo filósofo Aristóteles, quando este observa um eclipse solar. Ele utiliza um aparelho que contém um pequeno orifício, por onde a luz atravessa e se expande antes de chegar ao chão. A evolução da câmara escura se deu principalmente por físicos e astrônomos que observavam eclipses solares através dela, como o astrônomo árabe Al Hazen no século XI e o filósofo e matemático Roger Bacon no século XIII. (CALAÇA, 2012) Durante a Renascença, alguns pintores utilizavam a câmara escura como um aparelho auxiliar em seus desenhos, já que esta poderia refletir uma imagem real a uma tela mantendo as mesmas proporções, contudo, com uma nitidez muito baixa. No início do século XVI, pintor e inventor italiano Leonardo Da Vinci resolveu esta questão, colocando uma lente de vidro no lugar do orifício. Nos séculos XVII e XVIII, vários pesquisadores utilizavam a câmara escura a fim de gerar imagens em um material fotossensibilizado. Utilizando sais de prata (pois já se sabia na época que a prata escurecia em contato com a luz), estes pesquisadores obtinham sucesso no ato de gravar as imagens, mas não sabiam como interromper o processo de gravação. Assim, elas desapareciam rapidamente, pouco depois de serem retiradas da câmara escura, mesmo se permanecessem em um ambiente com pouca luz. Encontrar um material que servisse como fixador de imagens foi um grande desafio para estes pesquisadores até o século XVIII. No ano de 1826, um francês chamado Joseph Nicéphore Niépce, fazendo testes com um material coberto com betume da Judéia e sais de prata, consegue gravar e fixar uma imagem (CALAÇA, 2012). Esta, que retrata a vista de uma janela, é considerada a primeira fotografia da história, e a técnica foi batizada pelo próprio Niépce de heliografia. Contudo, Niépce não quis revelar ao mundo sua descoberta. Ele guarda para si os segredos da heliografia até que conhece o também francês Louis Jacques Mandé Daguerre. Este já utilizava a câmara escura na produção de desenhos e dioramas quando se interessa pelo que viria a ser um dia a fotografia. Ao conhecer Niépce e a heliografia, ambos decidem assinar um contrato de sociedade, em 1829, para dar continuidade às pesquisas (TURAZZI,2008).

Resultado de imagem para Vista da Janela, a primeira fotografia criada por Niépce

Figura 2:Vista da Janela, a primeira fotografia criada por Niépce

Diante dos poucos avanços da sociedade, Daguerre decide dar continuidade às suas pesquisas sem a ajuda de Niépce, utilizando sais de prata. Niépce morre em 1833, Daguerre segue seus trabalhos e descobre dois anos depois que o vapor do mercúrio funciona como revelador nas imagens. Diz-se que esta descoberta foi acidental, aconteceu em um dia quando Daguerre guardou algumas placas sensibilizadas em um armário e, ao retirá-las no dia seguinte, percebeu que as imagens estavam muito mais nítidas e não escureciam com a luz ambiente. Constatou então que um termômetro havia quebrado dentro do armário e passou a incluir o mercúrio em suas pesquisas. Descobriu que este material, além de servir de revelador, diminui de horas para alguns minutos o tempo de exposição. Com isto, tornou-se possível a fotografia não somente de paisagens e objetos inanimados, como acontecia antes, mas também de pessoas, desde que estas ficassem sentadas e imóveis diante da câmara escura. Surge o daguerreótipo. O processo para obtenção de um consiste em sensibilizar uma placa de cobre revestida de prata polida e sensibilizada com vapor de iodo. Coloca-se o material, que é sensível à luz, em uma câmara escura por alguns minutos e ao se retirar, outiliza-se o vapor de mercúrio como revelador. Para se fixar a imagem, era usado o cloreto de sódio, sendo substituído mais tarde pelo tiossulfato de sódio, que dava maior durabilidade à imagem (OKA, ROPERTO). O resultado era um positivo único, nítido, sem caráter reprodutivo, que deveria ser protegido por um vidro a fim de evitar a oxidação. O novo invento foi revelado ao mundo no dia 19 de agosto de 1839, sendo reconhecido pela Academia de Ciências de Paris. Além de ter seu nome na invenção, Daguerre passou a receber uma pensão vitalícia do governo, para que qualquer pessoa pudesse utilizar o daguerreótipo sem precisar pagar patente, o que fez com que este se espalhasse com certa rapidez, visto que era de fácil reprodução. O tempo de hegemonia do daguerreótipo foi curto; durou até por volta da década de 1850, pois nesta época outros processos de gravação de imagem mais baratos, rápidos, e que proporcionavam a reprodutibilidade foram criados, como o Calótipo, do inglês Willian Fox Talbot, o que não diminui a importância histórica do daguerreótipo Diz-se muitas vezes que foram os pintores que inventaram a fotografia (transmitindo-lhe o enquadramento, a perspectiva albertiniana e a óptica da câmara obscura. E eu digo: não, foram os químicos. Porque o noema só foi possível a partir do dia em que uma circunstância científica (a descoberta da sensibilidade à luz dos sais de prata) permitiu captar e imprimir diretamente os raios luminosos emitidos por um objecto diretamente iluminado. (BARTHES, 2009, p. 91) Barthes atribui toda a criação da fotografia aos químicos, no momento em que o daguerreótipo surge e revoluciona toda uma geração e muda a maneira de registrar a história.
  

Nenhum comentário:

Postar um comentário